Foram identificadas 200 casas

A Associação Saber Compreender, que apoia sem-abrigo no Porto, identificou 200 casas abandonadas dentro das quais moram cerca de 400 pessoas, indicaram esta noite os responsáveis, numa iniciativa em que o Bloco de Esquerda (BE) participou como convidado.

O divórcio e um crédito relativo a habitação lançou na rua Raquel (nome fictício), de 40 anos. Vive numa casa abandonada sem água nem luz e desde 2009 não tem qualquer rendimento, socorrendo-se da alimentação e das roupas oferecidas pelas associações e dos duches da chamada Casa da Rua, na zona da Batalha, onde às vezes tem de esperar que outras 20 ou 30 pessoas terminem para ter 15 a 20 minutos de água.

“A questão da morada é o mais difícil. Não ter morada faz com que o Rendimento Social de Inserção (RSI) não seja renovado”, refere, quando questionada sobre qual a principal necessidade de quem vive na rua.

A “reivindicação” de Raquel vai ao encontro do que o BE quer ver implementado porque a renovação automática do RSI já consta do Orçamento do Estado mas ainda não está em prática.

A porta-voz dos bloquistas, Catarina Martins, que acompanhou a iniciativa da Saber Compreender, diz ainda ser “urgente” a criação de alojamento público temporário, denunciando que “muitas pessoas são obrigadas a residir em pensões muito degradadas ou muito caras”.

Para o deputado do BE José Soeiro, é “necessário” que se criem “os chamados hotéis sociais” e “condições de acesso a balneários públicos”, isto “já para não falar da revisão das contas que se misturam com o RSI”, um apoio social que atualmente é de 180 euros.

“A política não é de regra e esquadro. É preciso ouvir as pessoas e perceber o que se passa, perceber quais são os problemas para podermos criar soluções que respondam efetivamente”, disse Catarina Martins, vincando que a 17 de maio vai decorrer na Assembleia da República uma audição com as associações de todo o país que lidam com estas situações.

Por iniciativa do BE, foi aprovado um projeto de resolução que pede que seja reativada a Estratégia Nacional para a Inclusão de Pessoas Sem-Abrigo, um programa “travado” pelo anterior Governo PSD/CDS-PP “quando deveria ter entrado em fase de avaliação”, criticaram os dois deputados bloquistas.

A criação de uma lavandaria e de um balneário públicos na baixa do Porto são exatamente os “sonhos” da Associação Saber Compreender, constituída há cerca de meio ano e que integra voluntários, alguns dos quais ex-sem-abrigo.

Distribuem de 15 em 15 dias ‘kits’ de comida – esta noite havia fruta, água, sumo e bolo – de acordo com as doações que têm e roupa, mas “acima de tudo distribuem abraços”, resumiu Raquel.

Um levantamento feito por esta associação revelou que existem cerca de 400 pessoas a viver em cerca de 200 casas abandonadas da baixa do Porto.

“Há famílias a viver nessas casas”, disse a responsável Dora Matos.

Dados da rede NPISA – Núcleo de Planeamento e Implementação Sem-Abrigo apontam para 2.000 pessoas em situação de sem-abrigo no Porto, cem das quais a viver na rua já sinalizadas por associações, 400 em casas abandonadas e as restantes em “respostas temporárias” da Segurança Social (pensões ou albergues).

A Associação Saber Compreender quer ser mais do que uma estrutura que “passa e distribui comida”: “Ajudamos junto da Segurança Social a tratarem de documentos, aconselhamos ajuda médica, fazemos acompanhamento para que não se sintam desamparados”, contou a responsável, que desempenha funções ao lado de Cristian Georgescu, romeno, 37 anos, há cinco em Portugal.

É voluntário na Saber Compreender, um nome que assenta por completo ao seu caso, já que viveu na rua durante dois anos.

“Conheço esta realidade na primeira pessoa. Percebi que era voltando à rua como voluntário que melhor podia ajudar”, contou, descrevendo um cenário em que encontra “cada vez mais sem-abrigo novos no Porto” e defendendo a necessidade de “mais técnicos” e “melhores políticas sociais”.

 

Referências: TSF, DN

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